quarta-feira, 20 de abril de 2011

Are You Lonesome Tonight?





CORAÇÃO POLAR




Não sei bem de que cor são os navios
quando naufragam
no meio dos teus braços
sei que há um corpo
nunca encontrado algures no mar
e que esse corpo vivo
é o teu corpo imaterial
a tua promessa
nos mastros de todos os veleiros
a ilha perfumada das tuas pernas
o teu ventre de conchas e corais
a gruta onde me esperas
com teus lábios de espuma e de salsugem


Os teus náufragos
e a grande equação do vento e da viagem
onde o acaso floresce com seus espelhos
seus indícios de rosa e descoberta.


Não sei de cor é essa linha
onde se cruza a lua e a mastreação
mas sei que em cada rua há uma esquina
uma abertura entre a rotina e a maravilha
há uma hora de fogo para o azul
a hora em que te encontro
e não te encontro
há um ângulo ao contrário
uma geometria mágica
onde tudo pode ser possível
há um mar imaginário
aberto em cada página
não me venham dizer que nunca mais
as rotas nascem do desejo
e eu quero o cruzeiro do sul das tuas mãos
quero o teu nome escrito nas marés
nesta cidade onde no sítio mais absurdo
num sentido proibido ou num semáforo
todos os poentes me dizem
quem tu és.

in «Senhora das Tempestades»,
Dom Quixote,
Lisboa, 1998

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